domingo, 14 de novembro de 2010

Peça de mim mesma

Hoje eu fui ao teatro. Mas, sabe, não me sinto bem. Não, não, não, a peça estava ótima; o texto era maravilhoso; o ambiente, bem cuidado; e as mulheres, tão boas atrizes quanto bonitas. Aliás, descobri que me apaixono por mulheres mais velhas. São aquelas minhas paixões de um quarteirão só, que mudam de esquina em esquina, aquelas que todo mundo já conhece. Ninguém entende como consigo andar cidades e cidades a base de mulheres impossíveis. Mas dizem que faz bem ter uma musa inspiradora. Ou duas. Ou três. Elas ficam na minha cabeça por aproximadamente três segundos, o suficiente pra eu adentra-las e devora-las antes de atravessar a rua. Mas nada impede que depois as encontre de novo e o ritual se repita.

E é essa vida toda de rituais e repetir de formas diferentes os mesmos textos e paixões já decoradas que me fazem, muitas vezes, pensar que estou numa peça de teatro. Olho o mundo com olhos de quem encara, dou um risinho de meia boca e olho em volta. Faria um monólogo meio inquieto, cheio de dúvidas, o que me deixaria com um ar mais instigante ainda. Andaria pelos corredores com cara de medo e repetindo antigos versos que acabei de conhecer. Observaria profundamente cada passante como se fossem meus espectadores e os deixaria sem graça - ou quem sabe me desafiariam ainda mais. "Mundo, quem és tu?!" - perguntaria-me. Mas não obteria respostas no meu monólogo, mesmo que ele não fosse um monólogo.

Isso tudo faz com que minha mãe me chame de estranha. Meu pai, de ET. Minha vó, que é preciso atentar às minhas tendências comportamentais. E eu, que tudo isso é um sinal de que a vida não é teatro: a realidade está longe de ser pré-escrita. E quem dirá por um alguém dirigida e ensaiada! Queria que fosse. Não seria preciso me mostrar todo o roteiro, agradeceria algumas surpresas, mas, quem sabe, assim, eu não me sentiria assim como me sinto hoje.

Sinto-me incompleta. Normalmente eu diria vazia, mas a áurea da peça me preencheu um pouco. Eu até tinha companhia, duas amigas. Mas não gosto delas juntas e eu sobrando. Não por elas acabarem ficando mais juntas e eu um pouco deslocada, mas porque elas me dão uma certa tristeza. Me lembram a relacionamento, dor, sentimento.

Amor perdido dói. Não o amor que se perdeu pelo tempo, mas aquele que deixamos escapar de nossas mãos e nunca mais o recuperamos. A sensação é estranha. Pego meu ingresso para tentar me distrair e vou passando o dedo, suavemente. Sinto uma tristeza, um arrepio, a ponta dos meus dedos são sensíveis como eu. As luzes não são mais a mesmas e, mais uma vez, eu me sinto inundada da melancolia alheia que pertence mais a mim do que aos outros.

Acabo sendo sozinha. Então escrevo. Não tenho a técnica de encenar o que penso, mas sei tenho o dom da palavra. Não tenho pessoas e amigos que realmente me entendam, mas as palavras estão sempre ali para me ouvir, para encarar os meus olhares e não se intimidarem. A incompreensão dada a um alguém que absorve sensações adversas e gosta do silêncio de si mesma é impressionante. Ninguém também entende quando quero fazer do mundo uma peça de teatro, onde eu possa ser a única personagem do meu monólogo e possa passar todo o tempo no silêncio falando sem parar, debatendo comigo mesma somente no encarar de tantos olhos descrentes e uns poucos sorrisos de concordância.  Deve ser maravilhoso sentir que as pessoas compreendem sua dor enquanto elas riem, e não choram de pena, assim como as letras fazem, enquanto sambam nos sentimentos. A dor é essencial e onipresente, na vida, na peça. Em mim, em você. A arte também.

2 comentários:

Camila disse...

Adorei! A vida é um stand-up comedy, amiga, não se iluda! Apenas ria.

Camila disse...

Adorei! A vida é um Stand-Up Comedy, amiga, não se iluda! Apenas ria um pouco da cara dela. Funciona, acredite.