Tudo que eu queria eram umas fotos e a nostalgia das feiras de rua. Ia andando pelas ruas do centro da cidade durante um sábado de manhã, observando a feira e seus presentes. Cenas interessantes, diria eu. Tirei algumas fotos, mas logo fui abandonada pela minha máquina, que havia ficado sem bateria.
Mais a frente, vi que estava tendo uma feirinha de antiguidades na Rua dos Inválidos e resolvi dar um pulinho lá. Pendurei a câmera no pescoço - ainda restava uma mísera esperança que ela retornasse a vida - e fui andando despreocupada. Os vinis e as vitrolas me chamavam a atenção por uma longa parte do percurso, sempre gostei de coisas antigas.
De repente, percebo que minha máquina caiu e, antes que eu pudesse fazer qualquer coisa, ouvi um creck. Minha única reação foi olhar para baixo, observar um par de pernas e, ainda olhando para baixo, exclamar um palavrão. Olho para cima e vejo um homem de aparência medíocre e de olhos vagos me olhando. Meus nervos ficaram a flor da pele.
Comecei a reclamar e chama-lo de tudo que era nome, enquanto ele me pediu um pouco de calma e me chamou para conversar. Calma? Mas é claro! Conversar. Discutiríamos o preço de uma câmera nova.
Sentamo-nos em um daqueles bares boêmios da região da Lapa e ele pediu um chá gelado. Chá gelado! Estávamos num bar, cara! Meu Deus, quem eu arrumei para quebrar minha câmera? A moça me perguntou se eu queria alguma coisa. Neguei, alegando que estava sem dinheiro. Ele, então, pediu um outro chá gelado para mim. Obrigada, moço, era o que eu queria.
Ajeitou os óculos, se acomodou na cadeira e me encarou, esperando que eu começasse a falar. Ai, que cara nerd. Então, reclamei dele, falei de sua distração e do chá gelado. Ele disse que não teria problemas em pagar a câmera, mas não entendeu o que o chá gelado tinha a ver com a máquina quebrada.
Estávamos num bar, caramba! Não era difícil de entender o que eu queria dizer. Ele somente olhou e disse "E..?". Aquilo já estava me tirando do sério.
Discutimos mais um pouco - câmeras, fotos, paisagens. Amor? Não, obrigada, não acredito. Ele riu e disse que eu era a primeira mulher que tinha essa opinião. Dei ombros e alguma resposta malcriada que o fez parar e refletir um pouca. Mudou o rumo. As coisas ficavam mais simples com ele. A conversa fluía, por mais estranho que aquilo pudesse parecer para mim. Ele era interessante, mas ainda bebia chá gelado.
Sempre gostei de pessoas com bom papo. Bom papo e inteligentes. Ele, não sei nem seu nome, tinha ambos e ainda estava numa feira de aniguidades. Feira de antiguidades! Não reconheço nada nesse mundo tão a minha cara quanto isso. Ligando os pontos, seria perfeito se não fosse o chá gelado. Ele, de fato, tinha tudo para me conquistar. Nem que fosse por um dia. Mas, sempre pensando que sou segura de mim, resolvi não cair em tentação-amém.
Conversa vai, conversa vem, num dado momento decidi que iria embora. Comecei a me levantar para ir dizendo que ele conquistara minha confiança, mas que ainda me devia uma câmera nova. Desolado, perguntou por que eu estava indo se ainda não tínhamos tomado outra. Não tínhamos nem tomado uma! Ele me convenceu e pediu duas cervejas. O papo dele era realmente muito bom. A cerveja então, nem falo.
Como a conversa ia fácil, nem me liguei no tempo. Pra falar a verdade, não tenho muita ideia de que horas o acidente aconteceu. 11h? 12h? Continuamos conversando e lá pelo começo da noite já não estávamos totalmente sóbrios. Na verdade, tudo rodava. Parecia que estava em uma valsa, onde a voz dele era a melodia bem marcada e ele me envolvia em seus braços fazendo-me dançar. Lembranças de uma bêbada.
Lembro dele ter pagado a conta e me colocado no carro delicadamente, juntamente com uma musica. Não lembro muito bem. Só sei que no dia seguinte acordei ao seu lado. Não tinha dor de cabeça, nem enjoo. Tinha eu - incrivelmente de camisola -, o homem do chá gelado e uma máquina quebrada em um quarto claro. Mas eu não sei o que aconteceu.
Senhor! Eu só queria dele minha câmera de volta e, quem sabe, umas cervejas!
2 comentários:
Muito a sua cara esse texto.
Muito a sua cara esse texto.
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